Empresas ‘lixo zero’ contribuem para 83 milhões toneladas de resíduos não chegarem a aterros e incineradores

 

Em um mundo que produz 11,2 bilhões de toneladas de resíduos sólidos por ano e em um país – Brasil – em que a média de reaproveitamento de resíduos é de apenas 4%, avançar na circularidade é vital. Segundo a organização sem fins lucrativos Instituto Lixo Zero, um grupo formado por 83 empresas foi responsável por dar destinação correta a 83,62 milhões de toneladas de resíduos em 2023, evitando que sejam enviados a aterros ou incinerados.

Os números constam no Anuário Lixo Zero, primeiro do gênero no Brasil, divulgado nesta quarta-feira (10), em São Paulo, durante o primeiro evento realizado pelo Movimento Nova Economia, lançado em janeiro por Carla Hoffmann, CEO da AWA Growth Partner. A publicação, desenvolvida pela certificadora Zeros, responsável por auditar o selo Lixo Zero e certificar empresas segundo suas diretrizes no Brasil, traz exemplos de companhias que adotaram políticas e ações e obtiveram resultados que lhes renderam a Certificação Lixo Zero.

Além de apresentar os principais resultados do relatório, o encontro também abordou, ao longo de três painéis, cases de companhias certificadas e oportunidades de desenvolvimento econômico a partir dos resíduos e da maturidade tecnológica para viabilizar ações de reúso e de destinação correta.

Hoffmann conta que o objetivo do evento é reconhecer as empresas que estão próximos a zero resíduos. “Não se pode pensar em uma nova economia, uma economia mais verde, que observe o impacto ambiental e social nas suas diretrizes fundamentais e busque viabilidade econômica para o impacto positivo, sem olharmos o resíduo pela perspectiva de compromisso e também de oportunidade”, afirma. Para ela, quanto mais promovermos o fomento de negócios regenerativos da cadeia de resíduos, melhor fica o desenvolvimento de toda cadeia.

“Os resíduos que vão para aterros representam uma matéria-prima de R$ 50 bilhões que não pode ser desperdiçada”, de acordo com o presidente do Instituto Lixo Zero, Kadmo Cortez, que participou do primeiro painel.

A certificação, que é homologada pelo Instituto Lixo Zero Brasil e validada pelo Zero Waste International Alliance (Zwia), é feita em etapas, envolvendo relatórios detalhados das ações e auditoria. Para ser certificada, a empresa precisa dar destinação correta a pelo menos 90% dos resíduos que produz. “Esse é o indicador mais importante”, diz Mateus Peçanha, CEO da Zeros. Nesse processo, é preciso fazer a separação adequada dos materiais e procurar prestadores de serviço que vão receber os diversos resíduos. “Isso é uma coisa complexa, porque há reciclagem, compostagem, reúso, às vezes são diversos tipos de material reciclável para lidar”, declara Peçanha.

Outros critérios observados são iniciativas para reduzir a quantidade de resíduos e a adoção de reúso, de equipamentos e processos para minimizar a geração das sobras, gestão de resíduos orgânicos e recicláveis, ter práticas de logística reversa, monitorar e controlar a geração de resíduos, adotar políticas internas de capacitação e de monitoramento e controle e implantar tecnologias inovadoras e práticas avançadas na gestão de resíduos. “Há uma nota de boas práticas e outra de encaminhamento correto”, acrescenta o CEO.

 

No rol de certificadas, 43% atuam em diferentes setores do ramo industrial, de montadoras a alimentos e bebidas, 33% são estabelecimentos comerciais, 17% participam da área de eventos e 3% de obras e sets de filmagens. Entre as indústrias, 39% são do segmento de alimentos e bebidas, como Kopenhagen, Solar Coca Cola e Campari do Brasil; 24% são automotivas, entre elas Hyundai, Volkswagen e Scania; e 10% são da área de embalagens, como Tetra Pak, Gomes da Costa e CPack. Outras empresas de setores diversos também marcam presença no anuário: cosméticos, biotecnologia, combustíveis, construção civil, a exemplo de BEMA de papel, Karsten indústria têxtil, Pet Love Alimento Animal e Unifique tecnologia.

 

De acordo com o relatório, a iniciativa Lixo Zero impactou direta e indiretamente mais de 702 mil pessoas, das quais 80% são contabilizadas como público de eventos. “Os eventos alcançam um número grande de pessoas, então, a certificação Lixo Zero também compreende um aspecto de educação do meio. O impacto é bem grande”, diz Hoffmann.

 

Nesse setor, a Casa Cor lidera ao dar destinação correta a 99,7% dos seus resíduos. Darlan Firmato, diretor de Operações de Sustentabilidade São Paulo, conta que o evento reduziu em 65% as 2 mil toneladas de resíduos que gerava. A mudança começou em 2016, quando a empresa aboliu as construções em alvenaria e centralizou a gestão de resíduos, antes dispersa entre os arquitetos participantes da exposição.

 

“Eram casas de dois pavimentos demolidas depois de dois meses com o fim da exposição. Imagine a quantidade de resíduos em tão pouco tempo, chegamos a ter 1.000 toneladas, na desmontagem, provenientes somente das alvenarias. Estávamos completamente fora em termos de sustentabilidade, principalmente no que diz respeito à construção civil”, destaca Firmato.

 

Um evento gera todo tipo de material residual, que precisa ser separado para ter a destinação adequada. São cartonados, metais, orgânicos, bituca de cigarro e até folhas que caem das árvores, segundo o executivo. Tampinhas de garrafa de água mineral, por exemplo, são enviadas a uma ONG que as usa no processo de castração de animais. “Também conseguimos fazer logísticas reversa com isopor. Já mandamos uma carreta inteira com o material para uma fábrica de Santa Catarina, que o utiliza na produção de rodapés.”

 

Em outra linha de atuação, material proveniente da desmontagem – piso, tecidos, mobiliário e até plantas – que não têm novo uso são doados para ONGs. As equipes são treinadas porque o material passa por triagem no canteiro da obra do arquiteto. A participação do público também é importante. Durante o evento, a Casa Cor orienta o público a despejar os resíduos no local certo para possibilitar a realização da triagem. “A certificação reflete as ações de economia circular feitas pela empresa”, afirma diretor de Operações da Casa Cor.

 

Na trilha do lixo zero também é possível se deparar com situações inesperadas. A Pet Love, outra certificada presente no anuário, precisou buscar uma solução criativa para os resíduos de pêlos de cachorro que ficam em suas lojas, provenientes de banho e tosa. O material é destinado para um fornecedor que utiliza na produção de mantas para retirar petróleo que vaza para o oceano, segundo Tayná Leme, supervisora da rede de lojas e produtos para animais de estimação.

 

A maior pontuação foi obtida pelo Centro de Distribuição da unidade Vinhedo da Volkswagen (Estabelecimentos comerciais), que chegou a 99,9%. Acima dos 99% também se destacam, entre outros, Embalagens Gomes da Costa (Indústria), com 99,2%, e Convenção de Vendas da Nestlé (Eventos), 99,3%.

 

“O evento tem o objetivo de reconhecer as empresas que alcançaram essa marca”, diz Hoffmann. “Não se pode pensar em uma nova economia, uma economia mais verde, que observe o impacto ambiental e social nas suas diretrizes fundamentais e busque viabilidade econômica para o impacto positivo, sem olharmos o resíduo pela perspectiva de compromisso e também de oportunidade”, acrescenta.

 

Foram três painéis com representantes de empresas certificadas. Cortez e Roberto Rocha, da Associação Nacional de Catadores, destacaram a importância da remuneração adequada de catadores como forma de gerar renda. O terceiro painel abordou a importância de os negócios de impacto gerarem ganhos. “O capital privado precisa ser destravado”, disse Beatriz Peres, coordenadora de investimento de impacto da Sitawi. Ela apontou o instrumento de blended finance da empresa como uma oportunidade de captação, que já foi utilizado pela cooperativa YouGreen, também presente ao evento.

 

No encerramento, ao lado de Daniela Garcia, CEO do Instituto Capitalismo Consciente, Hoffmann voltou a ressaltar que é possível tornar o lixo economicamente viável com matéria-prima para novos produtos.

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